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Termo Circunstanciado elaborado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo – uma decisão acertada do governador

Termo Circunstanciado elaborado pela Polícia Militar do Estado de São Paulo – uma decisão acertada do governador

Por Frederico Afonso*

 

Hoje é 21 de abril, feriado nacional – Dia de Tiradentes, mas também é a data comemorativa nacional para as polícias militares do país na forma da Lei nº 14.751/23[1] que instituiu a chamada “Lei Orgânica Nacional das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios” e parto desta data para escrever sobre o assunto tão erroneamente divulgado nos últimos dias por parte da imprensa[2], divulgando, em sua maioria, que a Polícia Militar do Estado de São Paulo fará investigações de crimes a partir de agora[3].

De início, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) (ou qualquer outro governador) não possui poder algum, possui competências descritas nas constituições estadual e federal e nelas, inexistem tal possibilidade de mudar a competência investigativa dos crimes comuns da polícia civil ou federal para a polícia militar.

Teria o governador Tarcísio, juntamente com outros tantos governadores (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Minas Gerais, Espírito Santo…) cometido um ato inconstitucional? Se, hipoteticamente o fosse, quem o declararia como tal? Se a afronta fosse em relação à constituição estadual, o Tribunal de Justiça do respectivo estado, por sua vez, se a relação de incompatibilidade fosse em relação à constituição federal, será o Supremo Tribunal Federal, em sede de controle concentrado, pois, em sede de controle incidental, qualquer juiz poderá fazê-lo[4].

Desta forma, todo ato normativo possui a presunção de validade até que o órgão competente o declare como inconstitucional, portanto, qualquer afirmação no sentido que o governador (ou o secretário de segurança) ao disciplinar que os termos circunstanciados sejam feitos pela Polícia Militar do Estado de São Paulo tenha praticado um ato inconstitucional, não passará de mentira!

Então, a questão é de hermenêutica? Poderia até ser, entretanto, se restava alguma dúvida sobre a natureza do termo circunstanciado (é um ato investigativo, ou um simples registro de ocorrência relativa ao cometimento de uma infração de menor potencial ofensivo), esta não existe mais desde que a Suprema Corte deliberou[5] sobre o assunto que não são atos de investigação.

Se inexiste divergência jurídica sobre a questão, temos então uma “guerra de narrativas”, por exemplo, ao ler “OAB-SP diz que plano de Tarcísio que empodera PM é inconstitucional” dando a entender que a Ordem dos Advogados do Estado de São Paulo divulgou algo, quando na verdade “A Comissão de Política Criminal e Penitenciária da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo (OAB-SP) encaminhou uma nota ao Metrópoles, nesta sexta-feira (19/4), em que critica o conjunto de ações da gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) que dão mais poder à Polícia Militar (PM)”[6].

Vamos à praticidade dos atos: elaborado o termo circunstanciado (por quem quer que seja), irá para o juizado especial criminal (JECrim), ou seja, irá para o Poder Judiciário, então, s.m.j., o Judiciário recusaria “de ofício” um ato que entendesse ser inconstitucional, mas não é isso que ocorreu, ocorre e ocorrerá, pois o Tribunal de Justiça de São Paulo, desde 2001, autoriza os juizados especiais criminais a aceitarem os termos circunstanciados registrados por policiais militares e em 2020 o Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE), que emite enunciados que servem de referência aos juizados especiais criminais de todo o país, elaboraram as Notas Técnicas nº 1, de 31/01/2020 e nº 2, de 4 de agosto de 2020, que são taxativas em dizer que os termos circunstanciados não são atos de polícia judiciária. Ainda reforçaram que “o compartilhamento da competência para lavratura de termo circunstanciado de menor potencial ofensivo entre todos os órgãos de segurança pública previstos no art. 144 da Constituição federal.

Nas diversas reportagens publicadas pouco (ou quase nada) se falou sobre as vantagens (ou desvantagens), acabaram focando em algo que, como afirmamos no meio jurídico, “stare decisis”. As vantagens estão em consonância com a Lei Maior do país, ou seja, busca a melhor prestação de serviço público visando a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, vejamos:

– a viatura registrará o termo circunstanciado no local dos fatos, de forma que a comunidade não tenha o afastamento da viatura da sua área de atuação, aumentando a presença do policiamento ostensivo e o pronto atendimento de outras demandas. Isso equivale dizer que a ostensividade é potencializada, com a presença das viaturas nos seus setores de prevenção e preservação da ordem pública, não havendo deslocamentos para as delegacias de polícia, onde ficam aguardando tempo considerável para a elaboração de uma simples ocorrência de autoria já conhecida e que não demanda nenhuma investigação;

– o cidadão não precisa ser conduzido à delegacia de polícia nem no momento da ocorrência, nem posteriormente em decorrência de um notificação para prestar depoimento, o que ocasiona transtornos à sua vida cotidiana;

– também em favor da população, a Polícia Civil pode desincumbir seus policiais de situações de mero registro e encaminhamento de termo circunstanciado ao Poder Judiciário (JECrim), disponibilizando-se mais tempo para exercício de sua atribuição constitucional, de investigação e apuração das infrações penais, em especial, as de maior gravidade (roubos, furtos, sequestros, homicídios etc.), dando uma resposta mais favorável ao anseio dos cidadãos;

– o registro do termo circunstanciado pela Polícia Militar no local dos fatos evita deslocamentos desnecessários da viatura policial-militar, o que gera grande economia ao Estado e respeito ao cidadão no uso dos recursos que paga por meio de impostos, os quais podem ser aplicados em outras necessidades da população.

Ganha a Polícia Civil que, além de poder continuar registrando o termo circunstanciado a quem comparece diretamente à delegacia de polícia (com os registros também podendo ser feitos pela Polícia Militar), ficará com os seus recursos humanos empregados e direcionados para a principal atividade que é a investigação, em especial dos crimes mais graves.

Ganha a Polícia Militar, que registrará de forma mais rápida a ocorrência, e isso sem a necessidade de as viaturas deixarem as suas áreas de atuação, aumentando a prevenção e a ostensividade, bem como a preservação da ordem pública, de maneira a dar uma resposta mais célere às demais ocorrências, visto não estar parada em distritos policiais, aguardando serem atendidas.

Ganha o Estado, que terá enorme redução de gastos com combustíveis, viaturas e horas de trabalho de profissionais, evitando-se um retrabalho totalmente desnecessário.

E, por fim, a maior vitoriosa de todas será a sociedade!

Se há vantagens para todos, por que parte da imprensa vem trabalhando de forma contrária?

Estou esperando sentado para descobrir…

 

* O autor é advogado (membro permanente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP), professor e escritor Jurídico. Membro da Rede Brasileira de Educação em Direitos Humanos (ReBEDH). Mastering of Science in Legal Studies, Emphasis on International Law pela MUST University (Flórida/EUA). Mestre e Bacharel em Ciências Policiais de Segurança Pública e Ordem Pública pelo Centro de Estudos Superiores da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Mestre e Bacharel em Direito pela Universidade Metropolitana de Santos e pela Universidade São Francisco respetivamente. Especialista em Direitos Humanos, Gestão da Segurança e Ordem Pública pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Especialista em Direitos Humanos e em Direitos Humanos Aplicado pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo e pela Faculdade CERS respetivamente. Especialista em Direito Constitucional e em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade CERS e pela Faculdade Legale respectivamente. Autor pelas editoras SaraivaJur, Forense, Método dentre outras. É professor de Direitos Humanos no Damásio Educacional, no Centro de Altos Estudos da Polícia Militar, na Academia de Polícia Militar do Barro Branco (SP) e na Diretoria de Polícia Comunitária e Direitos Humanos da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Atualmente é o diretor jurídico da Defenda PM e diretor de coordenação institucional e política da FERMESP – Federação das Entidades Representativas dos Militares do Estado de São Paulo.

[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/l14751.htm. Acesso em 21 abr. 2024.

[2] “Tarcísio dá poder de investigação à PM e batalhão vai suprir delegacia” em: https://www.metropoles.com/sao-paulo/tarcisio-poder-investigacao-pm. Acesso em 21 abr. 2024.

“Tarcísio amplia poder da PM, esvazia Polícia Civil e agrava rixa entre corporações” em: https://www.estadao.com.br/politica/tarcisio-amplia-poder-da-pm-esvazia-policia-civil-e-agrava-rixa-entre-corporacoes/. Acesso em 21 abr. 2024.

“Plano de Tarcísio de esvaziar Polícia Civil é inconstitucional, diz OAB-SP; governo cita jurisprudência do STF” em: https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/pedro-venceslau/politica/plano-de-tarcisio-de-esvaziar-policia-civil-e-inconstitucional-diz-oab-sp-governo-cita-jurisprudencia-do-stf/. Acesso em 21 abr. 2024.

“Tarcísio deve liberar PM para registrar pequenos delitos, em nova derrota à Polícia Civil” em: https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/04/tarcisio-deve-liberar-pm-para-registrar-pequenos-delitos-em-nova-derrota-a-policia-civil.shtml. Acesso em 21 abr. 2024.

“Delegado-geral reage após Tarcísio ampliar o poder da PM em São Paulo… Leia mais em https://www.cartacapital.com.br/sociedade/delegado-geral-reage-apos-tarcisio-ampliar-o-poder-da-pm-em-sao-paulo/. O conteúdo de CartaCapital está protegido pela legislação brasileira sobre direito autoral. Essa defesa é necessária para manter o jornalismo corajoso e transparente de CartaCapital vivo e acessível a todos” em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/delegado-geral-reage-apos-tarcisio-ampliar-o-poder-da-pm-em-sao-paulo/.

“OAB-SP diz que plano de Tarcísio que empodera PM é inconstitucional” em: https://www.metropoles.com/sao-paulo/oab-sp-diz-que-plano-de-tarcisio-que-empodera-pm-e-inconstitucional. Acesso em 21 abr. 2024.

[3] As polícias militares possuem competência investigatória apenas para os crimes militares.

[4] Na Constituição federal: Art. 97 – Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público. Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I – processar e julgar, originariamente: a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;

Na Constituição paulista: Art. 74 – Compete ao Tribunal de Justiça, além das atribuições previstas nesta Constituição, processar e julgar originariamente: VI – a representação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal, contestados em face desta Constituição, o pedido de intervenção em Município e ação de inconstitucionalidade por omissão, em face de preceito desta Constituição;

[5]         ADI 5637 (julgada em 2022, tendo como relator o ministro Edson Fachin) e as ADIs 6.245 e 6264 (julgadas em 2023, tendo como relator o ministro Luís Roberto Barroso).

[6] https://www.metropoles.com/sao-paulo/oab-sp-diz-que-plano-de-tarcisio-que-empodera-pm-e-inconstitucional. Acesso em 21 abr. 2024.

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