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Vingança é um prato que se come frio-professor frederico afonso

Vingança é um prato que se come frio!

Vingança é um prato que se come frio![1]
A concepção popular de como se deve agir com vingança dá a ideia de que ela deve ser premeditada com paciência, sem pressa, deixando que os envolvidos se descuidem de sua segurança por não esperarem mais serem atacados. Esta ideia já afasta, de pronto, a visão que o editorial do “Estadão” quer fazer com que você, leitor e leitora, tenha da ação da Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP) na baixada Santista, em razão das, frise-se, DAS mortes de policiais militares ocorridas naquela região nos últimos dias (em um intervalo de 17 dias, o número de policiais militares assassinados neste ano já supera o total de policiais militares mortos por criminosos no primeiro trimestre de 2023 em São Paulo – 03 na baixada santista). Ao ser atacada (a PMESP), tem que agir de imediato, para se proteger, para então conseguir proteger a própria sociedade.

A PMESP, obedecendo as constituições vigentes (federal e estadual), tem como função “realizar a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública”, jamais realizar vingança.

Por tratar-se de um órgão da chamada “administração direta”, está submissa aos chamados “Princípios Constitucionais da Administração Pública”, dentre eles, com destaque, a impessoalidade, algo incompatível com uma vingança.

Podemos presumir, portanto, que atribuir confrontos que resultaram em óbitos à vingança, soa mais como uma vingança do próprio editorial do que da PMESP, já que o jornal pode agir com pessoalidade. Como tem feito!

Quando uma pessoa morre, em confronto com a polícia, vamos falar aqui, no caso, com a PMESP, são instaurados dois inquéritos policiais (um civil e um militar), que chegarão ao Ministério Público, que analisará os relatórios das autoridades policiais (delegado de polícia e oficial da PM) e, estando “satisfeito” (nos termos da lei, sempre), encaminhará ao juízo para o prosseguimento ao rito do tribunal do júri. Afirmar que ocorreram “vinganças” é desacreditar todo o sistema de persecução penal do Estado…

O que é realmente estarrecedor é que as mortes dos policiais (o editorial menciona como “a morte de um PM durante patrulha em Santos”), inominados no texto, não tenham causado nenhuma comoção. Vamos ficar com o exemplo do policial Samuel Wesley Cosmo, soldado da PMESP, integrante do 1º Batalhão de Polícia de Choque – ROTA, que deixou uma viúva e duas filhas pequenas (gêmeas). Samuel tinha apenas 35 anos. Estarrecedor é o editorial não mencionar que a viúva estava pedindo ajuda (“vaquinha”), pois sabe que vai demorar algum tempo para restabelecer parte do salário (pensão) do seu marido. Estarrecedor é o editorial não mencionar que o pai do Soldado Cosmo, o policial civil do Distrito Federal – Antônio Marcos Cosmo, 52 anos, teve que enterrar o segundo filho policial morto por criminosos. Qual a lógica de um pai enterrar DOIS FILHOS POLICIAIS MORTOS POR CRIMINOSOS?

Mais estarrecedor é ler “Salvo as manifestações de praxe por parte de grupos de defesa dos direitos humanos”, grupos esses que não teceram uma linha sequer sobre a morte dos policiais, sobre as viúvas, os filhos, os pais, os amigos, mas fizeram suas manifestações “de praxe”, pois é assim que os direitos humanos funcionam no Brasil. Uma nota de “meia linha”? Não existe, pois parece imperar a indiferença às mortes dos policiais diante da evidente truculência dos criminosos, em que pese o editorial querer inverter isso, romanceando o criminoso. Outra prática recorrente.

Ultimamente, tomou-se de assalto o tecnicismo sobre o “Estado Democrático de Direito” (EDD). Afirmar que não vigora o EDD nas regiões mais pobres é de uma “profundidade de um pires”. Se em determinada região falta algum direito social, há uma violação de um mandamento constitucional, mas não a falta do EDD. Se, hipoteticamente, em uma dessas ocorrências com resultado morte for apurado, pelas autoridades legais, que houve afronta ao devido processo legal, haverá a responsabilização de todos, em não ocorrendo, teríamos improbidade, abuso de autoridade, outros crimes, mas não a “extinção do EDD”. A expressão “virou moda” agora, e, igual a uma arquibancada de estádio de futebol, cada qual “grita pelo seu conceito”, mas apenas os técnicos o operam com o rigor devido.

O editorial critica a falta de interesse sobre as mortes, mas traz a questão em um dos principais jornais do País. Porém, pela “falta de interesse nas mortes dos policiais”, não mereceu um editorial no jornal. Seriam os policiais militares mortos menos importantes que as demais pessoas? Seriam “menos humanos”? Pelo que se lê no editorial, a resposta é sim!

Se a Constituição Federal afirma que “A segurança pública, dever do Estado, direito e RESPONSABILIDADE DE TODOS”, é inaceitável que uma parte da população paulista não se sensibilize com a morte de um dos seus representantes. A PMESP não pertence ao governador, ao secretário, ao comandante geral ou ao delegado geral, mas sim à sociedade, é um órgão de Estado, não de Governo.

O editorial aponta que os policiais agiram e agem de forma arbitrária e “sequer disfarçam isso”. Basicamente não se disfarça aquilo que não precisa ser disfarçado, não se disfarçaram os atos pois estão dentro do devido processo legal. Querer trazer a intervenção militar de (1964-85) para o contexto atual, cujos policiais atuais sequer, em sua maioria, tinham nascido, não viveram aquela história, quiçá nos bancos escolares na forma que o historiador quis passar…, é forçar demais. Quando ocorre uma morte violenta, na maioria das vezes, teremos ali um homicídio, pouco importando, para o tipo penal o nome do formulário a ser preenchido. Se os “autos de resistência” se mostraram superados quanto à nomenclatura, foram assim trocados. Se o policial matou alguém será homicídio, da mesma forma o criminoso que mata um policial, respeitadas as qualificadoras existentes em cada caso. Assim, o autor do disparo que vitimou o soldado Cosmo praticou um homicídio, pelo menos o editorial não colocou “suspeito” ou “estudante” ou “trabalhador”.

O secretário de segurança, Guilherme Derrite, foge ao “padrão PSDB” cuja pasta, na visão deste partido quase extinto, tem que estar nas mãos de alguém do Ministério Público, cuja carreira é jurídica e não de Ciência Policial (no dia 08 de junho de 2020 o Ministério da Educação homologou o Parecer CNE/CES nº 945/2019, e reconheceu as Ciências Policiais como uma área do saber). Derrite é Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, além de também ser Bacharel em Direito, portanto, conhece do assunto, além de ter experiência operacional, algo que nas últimas décadas não se via à frente da pasta (até general já foi colocado, como se também entendesse tudo a respeito – em que pese próximos, os artigos 142 e 144 da Constituição Federal, estão em capítulos diferentes).

O Estado detém o monopólio da força desde o início do século XX, basta ter uma noção da obra “Política como vocação” de um dos fundadores da sociologia moderna, Max Weber. Quando o Estado é atacado, a sociedade espera que faça algo, claro que dentro do devido processo legal, e para isso os policiais são formados, treinados e retreinados (nos infelizes dizeres de um ex-governador).

A escolha do secretário coube ao governador, trata-se do chamado cargo ad nutum, ou seja, livre nomeação e livre exoneração. No entender do governador Tarcísio Gomes de Freitas, engenheiro civil formado pelo Instituto Militar de Engenharia (IME), com especialização em Gerenciamento de Projetos, além da formação em Engenharia de Construção pela Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), a escolha do Derrite preencheu e preenche os requisitos no anseio de uma boa administração da pasta. Na visão do governador, é o que importa, mas, estarrecedor é a imprensa não conseguir mais pautar, se impor, exercer aquele “4º poder” de outros tempos.

Estarrecedor é ver um editorial questionar a vontade do eleitor. Derrite foi eleito duas vezes deputado federal porque convenceu seus eleitores de algo, ponto final. Isto sim é um Estado Democrático. Se hipoteticamente fosse um pensamento “deturpado” como aponta o jornal, o eleitor então também o seria?

Por fim, sobre as câmeras policiais (body cam), ao afirmar que “protegem os bons policiais”, podemos então concluir que o soldado Cosmo, ASSASSINADO, era um mau policial já que a câmera não o protegeu? Ou, o criminoso era uma boa pessoa?

* Por Ernesto Puglia Neto[2]e

Frederico Afonso Izidoro[3]

                                                                                                                                                                                                                                                          

[1] Ditado popular que sugere que a vingança precisa ser preparada, premeditada e realizada sem pressa. Resposta ao Editorial do jornal o Estado de São Paulo de 09/02/24 – “Placar sinistro”, p. A-16.

[2] Doutor, Mestre e Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública. Especialista em Direitos Humanos pela Universidade de São Paulo (USP). Coronel da Reserva da Polícia Militar de São Paulo. Foi Diretor de Polícia Comunitária e Direitos Humanos da PMESP. Foi professor de Direitos Humanos do Centro de Altos Estudos de Segurança da PMESP. É atualmente o secretário-executivo da Associação dos Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar (DEFENDA PM). Consultor na área de chefia e liderança.

[3] Mestre e Bacharel em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública. Mestre e Bacharel em Direito. Especialista em Direitos Humanos pela Escola Superior da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo (ESPGE). Especialista em Direitos Humanos, gestão da segurança e ordem pública pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Coronel da reserva da Polícia Militar de SP. Foi chefe do Departamento de Direitos Humanos da PMESP. É atualmente o diretor jurídico da Associação dos Oficiais Militares do Estado de São Paulo em Defesa da Polícia Militar (DEFENDA PM). Advogado, membro permanente da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP.

Fonte: DEFENDA PM

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